Tomou conta dos noticiários o escândalo envolvendo uma investigação da Polícia Federal sobre possíveis desvios de dinheiro público, liderados pelo prefeito de Rio Largo, Gilberto Gonçalves (PP), o GG, amigo de longa data de Arthur Lira (PP). Agora, a preocupação se estende a gestores de outros municípios alagoanos aliados de Lira também abastecidos pelos milhões do orçamento secreto.
Com a explosão do esquema, apelidado pela imprensa nacional de ‘Beco de Lira’, já que o recebimento da propina era feito num típico beco interiorano, diversas prefeituras já apresentam receio de que as apurações dos agentes da PF se ampliem pelo estado, pois a Litoral Construções e Serviços, apontada no relatório como a principal empresa de fachada, também possui contratos com outras cidades.
Como se trata de prefeito no caso, cabe ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região decidir sobre o prosseguimento ou não da investigação da Polícia Federal, o que já acendeu o alerta de prefeitos e secretários nos quatro cantos de Alagoas. Apenas em Rio Largo, o rombo nos cofres públicos e nas áreas da educação e saúde pode chegar a R$ 12 milhões, segundo o relatório vazado.
No inquérito, a PF conclui que Gilberto Gonçalves tem “apetite insaciável por dinheiro público” e “comanda uma verdadeira organização criminosa instalada no seio da prefeitura municipal de Rio Largo, destinada a desviar recursos públicos federais repassados ao município, e também verbas municipais”. Além da Litoral, os contratos também abarcam a Reauto Serviços e Comércio de Peças.
Como revelado ainda em maio, o presidente da Câmara destinou nada menos que R$ 357,5 milhões do orçamento secreto a cidades de Alagoas, sobretudo a de prefeitos parceiros, conforme esclarecimentos enviados pelo Congresso ao Supremo Tribunal Federal (STF). Para o seu pai, Benedito de Lira, prefeito da Barra de São Miguel, foram cerca de R$ 6 milhões empenhados.
Do montante, mais de R$ 93 milhões foram para os cofres da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), que utiliza as verbas para obras e serviços em municípios, fatos amplamente divulgados nas redes sociais para fins políticos. A estatal, em Alagoas, é gerida por Joãozinho Pereira, ex-prefeito de Teotônio Vilela e primo de Lira.
A união de Lira com Gonçalves, antigos colegas de Assembleia Legislativa, inclusive do esquema de ‘rachadinha’ de R$ 300 milhões, alvo da Operação Taturana, agraciou Rio Largo com ao menos R$ 16,7 milhões via emendas do relator, fora os milhões de outros parlamentares ainda desconhecidos. Em maio, chegaram R$ 8,9 milhões ao Fundo Municipal de Saúde de Rio Largo. A chamada ‘parceria tamanho GG’, como classifica o próprio prefeito.
Beco do dinheiro
Num beco em plena luz do dia, dois carros, um com representantes da acusada empresa laranja, o outro saindo da prefeitura, se encontraram seguidas vezes para o repasse de R$ 49 mil em espécie. A PF identificou 185 saques nesse mesmo valor de 2020 a 2022, de modo a fugir do COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), pois valores acima de 50 mil são identificados e informados.
Isto é, para a PF, o grupo chefiado por GG usou diversos recursos para ocultar a origem ilícita do montante desviado, como contas bancárias em nome de laranjas, saques na boca do caixa dentro do limite estabelecido, veículos oficiais sob guarda de seguranças policiais do prefeito, ruas de baixo movimento, dentre outras dissimulações. Contudo, as artimanhas não foram capazes de fugir do flagra das câmeras de segurança, nem da habilidade investigativa dos agentes.
Versões
À imprensa, Lira negou qualquer ligação com o esquema, argumentando que parlamentares são responsáveis por indicar as emendas, mas não fazem licitação, nem pagamento. “Eu sempre falei, sempre defendi o orçamento compartilhado por todos os parlamentares. Mais lícito, mais correto. Parlamentar tem responsabilidade na indicação, não na execução”, disse o deputado.
Já a defesa de Gilberto Gonçalves, que entrou com o pedido de habeas corpus no TRF para suspender o inquérito, afirmou, por nota, que a investigação da PF “não apresenta nenhuma prova da participação do prefeito na malversação de recurso público”. Ao passo que as empresas citadas adotaram o silêncio desde então.
Folha de Alagoas