Morre Zeza Pescadora: Força da Natureza

Morreu na tarde dessa terça-feira (3), em sua residência, em decorrência de diabetes.
Zeza ao lado da irmã, já falecida. (Fotos: arquivo pessoal.)

Absoluta força da natureza. Acho que a frase que mais podemos denominar essa mulher singular, forte, fenomenal. E foi exatamente seu habitat natural. De onde pareceu surgir: das águas do mar. Do ventre de alguma entidade dos mares. Foi nas águas salgadas que começou, que a tudo e a todos soube enfrentar dignamente. Zeza soube viver dignamente. Uma mulher desde sempre empoderada, bem antes de a palavra virar moda. De expressão forte, sempre sisuda, tinha traços marcantes, sucos profundos na pele do rosto por causa do sol que sempre procurou fugir sob um chapéu de palha.

Maria José dos Santos, seu nome de batismo, apesar de ser conhecida como Zeza Pescadora, ou Zeza do Peixe, morreu aos 75 anos (18/06/1947-03/01/2023), faleceu em sua residência, na tarde dessa terça-feira (3 de janeiro), por volta das 17h20, em consequência de diabetes. Estava acamada há dois meses. Natural de São José da Coroa Grande, Pernambuco, veio para Maragogi na adolescência, aos 17 anos de idade, com a mãe e os cinco irmãos, sendo três homens e três mulheres. Era casada com Arnaldo Marcelino dos Santos, seu único companheiro, também pescador. Teve dois filhos e uma filha, que lhe deram dez netos e três bisnetos.

Zeza ao lado do marido, com o filho primogênito nos braços.

Começou a pescar com rede de arrasto, na praia, mas desde seus 13 anos de idade já enfrentava o mar lá de fora em jangadas de colegas de profissão. Comprou a sua primeira embarcação aos 19 anos. Por volta dos seus 32 anos, conquistou seu primeiro barco a motor.

“Mas não escapou do preconceito. Imagina naquela época, uma mulher, que se trajava com roupas masculinas, ia para o mar só com homens, quando era obrigada a fazer até suas necessidades fisiológicas no meio dos homens”, conta seu sobrinho Josenildo Lima.

Mas Zeza nunca se dobrou a eles. Nunca sucumbiu. Sempre foi uma mulher muito respeitada. Adquiriu e conquistou seu respeito com muita valentia e pulso forte, instrumentos humanos para combater qualquer tipo de preconceito. E não foram poucas as piadas, os termos pejorativos. “Mulher homem”, “mulher macho”, “quer ser homem de todo jeito”. Quem não a conhecia pela sua maneira livre de viver, então, não economizava no verbo. Quando era preciso, até, chegava a levantar a mão, para mulher e homem. Mostrando seu lado guerreiro, que não estava para brincadeira com ninguém. Zeza nunca aceitou o estigma de vítima.

Depoimentos de dois grandes companheiros profissionais

“Uma companheira de trabalho muito boa. Começou a pescar comigo. Trabalhamos juntos por mais de 40 anos. Depois, comprou a jangada dela, casou-se, começou a trabalhar por conta própria. Uma mulher trabalhadora, que sempre soube controlar o seu dinheiro, nunca foi de esbanjar, e aí cresceu, soube conquistar suas coisas. Também teve a sorte de ter dois filhos trabalhadores.” Béu do Peixe

“Foi a única pescadora profissional cadastrada da região. Começou cedo, depois conheceu o Arnaldo e só cresceram juntos. O preconceito que ela sofreu, por incrível que pareça, veio da parte de um homem que não era do meio. Um policial, na época, zombou descaradamente quando a viu pela primeira vez usando vestido. Por falta de hábito, ele achava que ela não se adequava. Foi por causa dele que ela deixou de tentar. Entre os companheiros de pesca, não lembro de ela ter sofrido preconceito. E quem era doido? Quando não há liberdade, há o respeito. Gostava de ajudar as pessoas. Zeza sempre foi uma pessoa direita.” Biu Xicáu

Seu sepultamento será às 16h desta quarta-feira, no cemitério Santo Antônio.

Recebendo o Título de Cidadão Honorário na Câmara de Vereadores.

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